quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Meta, ou Uma história sem título

- Tô indo.
- Tá, meu amor.
- Posso passar aqui mais tarde?
- Você não precisa passar aqui mais tarde.
O rapaz desce as escadas com aquele diálogo na cabeça pensando em como seria interessante não voltar naquele dia. As últimas palavras de sua namorada saíram tão retintas que "virariam uma história", lembrava ele.
Usando tênis azul e meia soquete com pequeno detalhe laranja na barra, bermuda preta e t-shirt vermelha, a passos largos e rápidos, chegou a casa de um amigo, conversou e fumou um Hollywood vermelho.
Voltou para casa logo, caminhando rápido e cantando distraído baixo como na ida. Igual também era o seu pensamento sobre aquele diálogo. Queria escrever a história de um rapaz que se despedia da namorada com um diálogo como aquele e voltava para casa pensando em um rapaz que se despedia da namorada com um diálogo como aquele, e que voltava para casa para escrever a história de um rapaz que morria atropelado por uma moto num calmo cruzamento enquanto voltava para casa pensando em escrever uma história.
Acordado, ao nascer, pôs-se a pensar a respeito de como seria divagar sobre o real, intrépido e verossimilhante, sobre a vida do alguém, talvez, cantante de uma história assim como a dele.
O rapaz se sentia situado dentro da história que ainda nem começou a contar e já parece ter a forma de uma lauda completa. Incerto sobre querer escrever, disse que há muito tempo queria dizer aquilo e aí tudo o que lhe afligia refletia-se sobre a angústia da escrita, diante da infinitude de atos pensados. Ademais, escrever a vida era de alguma forma inventar outra vida. Retalhou-se nas tantas vidas não escritas e interrompeu-se para uma reunião.

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